Olhares sócio-antropológicos sobre Filmes, textos, artigos, livros, documentários,..

Amo cinema e vejo nos filmes inúmeras oportunidades de refletirmos sobre a vida, sobre temas diversos que nos tocam de maneiras diferentes, a partir de nossas grades de leitura e nossas vivências.
Assim, faremos neste primeiro momento reflexões sobre filmes, documentários que assisti e partilhei com meus colegas de sala (educandos) e outros que assisti em momentos de lazer criativo e produtivo. E, em um segundo momento farei comentários de livros, textos, artigos, enfim, o que li e como apreendi o lido, e os frutos de minha vivência, do meu dia-a-dia, do meu vivido também. Tudo isto será partilhado aqui com cada um de vocês!!

Boa Leitura!!

domingo, 17 de julho de 2011

A Cidade em Chamas (Afonso Lima)

   A Cidade em chamas é o livro de Afonso Lima, Advogado, Licenciado em História -UFPI e artista (ator, diretor, dramaturgo, compositor e escritor).
    Neste livro, apesar da leitura ser contagiante e fluida, pela disposição do texto que foi elaborado como "poema trágico de um crime impune", as queimadas ocorridas em uma cidade no Nordeste em meados dos anos 1940, mergulha-se no desespero de pessoas que perderam tudo, pessoas que foram forçadamente obrigadas a silenciar,e, por causa disto, este livro é dedicado aos "filhos de ninguém", pessoas que foram presas injustamente, e libertas graças a um homem, filho de pessoas influentes na época, e que foram defendidos por seu advogado, pois caso contrário terminariam seus dias na prisão.
    Assim, este livro é um misto de dor, sofrimento, angústia, superação, força, vitoria, embora na guerra, sabe-se que não há vitoriosos, uma vez que as perdas, também, são parte deste processo de lutas pelo poder.
    Neste incêndios eram interditadas ruas inteiras e, ninguém poderia entrar ou sair. Evidenciando várias mortes. Vamos ver alguns trechos para que entendam a profundidade do que se fala, através de fragmentos do Texto de Afonso Lima:
Primeiro Movimento, parte I: "Temeram as palhas da cidade na loucura de 41/ Amanhecera/ Era noite nas sarjetas da mente/ e queimava o brilho de estandartes/ subiram ruas e era triste a vida/ disseram alegrias e não chegaram"
Parte II- "Eram doridos sustos/ quando anunciaram o facho ardente/ Luzia (...) suspira um casebre seu / (...)/ 1941 tudo começara!/ o estadista grande e seus discípulos/ envoltos em maldade ou ilusão/ pensaram acabar com a miséria que habita a cidade empobrecida/ usando a caldeira pra vir a tortura Edasima e Domingos importaram.../"
1942,  "no reveillon de 1942/ os Diários se enchem de luz/ estouram-se champanhas brindando a vida e um novo ano surge assustado/ definitivamente marcado"
Na fala dos bairros, senti-me tocada, em especial, porque moro em um dos bairros que na época havia sido queimado, vejamos outros trechos de Afonso Lima:
"Cabral, Proenquanto, vai Cruzeiro/ Matinha, Matadouro, adeus Piçarra/ Vermelha, Cajueiros, Barrocão e mais lamentos e mais gritos/ e outros tantos sumindo na fumaça abraçados pelo fumo do terror"
é incrivel como as estórias foram contatas, manifestas, através do depoimento de pessoas que viveram nesta época ao mencionarmos o livro e a passagem acima.
Outro momento de Afonso Lima tão interessante como os anteriores são os que seguem a seguir:
"Quanta atrocidade em teu nome/ quanta traição aos teus filhos (filhos da cidade)/ acurralados pela 'chuva' tirana" O detalhe importante é que a palavra chuva aqui vem como sinônimo de fogo, que fora proibida de ser mencionada. Por isso, criaram a palavra Chuva para poder participar do processo de comunicação com vários outros.
 E, nesta escrita na parte IV tem-se que: "Manoel Gomes Feitosa agoniza quebrado, furado esvaindo-se devagar/ Malhado no epigástrio, no hipocôndrico, no íleo as lesões vão rompendo devagar/ pingo a pingo o sangue inunda o corpo minando a vida, a lucidez/ evaporando na fumaça a delação LIBERDADE!"
E no seu final é colocado que a palavra "fogo" volta a ser pronunciada, após mais uma batalha vencida!!

   Enfim, é uma poesia trágica, que possui no seu bojo, uma poesia denúncia!!

   Parabéns, Afonso LiMA, PARABÉNS!!!

   E, quem quizer falar com o Afonso Lima para obter a obra e conferir o que disse aqui, o endereço é: zafonsolima@hotmail.com.

    PARABÉNS, José Afonso!! Porque, através  do seu livro, nossa cidade, vai reavivando a memória e não apenas esquecendo de momentos dificeis, mas principalmente, observando o passado, não cometer, ou ver cometido os mesmos erros. SALVE!!!!!



    


quarta-feira, 13 de julho de 2011

Janela da Alma (Documentário Brasileiro de João Jardim e Walter Carvalho)

      Este foi e continua sendo um dos melhores documentários brasileiros que já assisti na proposta apresentada. O filme nos chama a uma reflexão sobre os olhos serem e terem sido considerados como "as janelas da alma". "Será que os olhos são, realmente, as janelas da alma?" "Será que a primeira impressão é a que fica?"
       Na Antropologia aprendi, com a vivência, que os olhos não são as janelas da alma, mas sim portas para equívocos, pois, no primeiro momento de um encontro com outro, observa-se, buscando traços ou características que nos coloquem em uma posição confortável com relação ao outro. Busca-se encontrar semelhanças, enfim, um encontro com um espelho, e, não com o outro como outro. E, neste processo interrelacional, os olhos julgam, pré-julgam, enquadram e são enquadrados nas dimensões culturais que permeiam nossas vidas. Fazendo que apenas a convivência, possibilite a ambos uma aproximação ou distanciamento, um real encontro consigo e com o outro como duas subjetividades, e, não projeções.
         Ao ver o documentário percebe-se na fala de Antônio Cicero que os olhos não são as janelas da alma, porque a janela não vê, "quem vê é o olho através da janela"... Oliver Sacks também diz que "os olhos como janelas, colocam-nos como passivos frente ao conhecimento ao mundo, em que tudo ou sai ou entra, e na realidade as coisas entram e saem a cada encontro, a cada conhecimento, a cada processo de crescimento, a cada partilha, assim, não somos passivos, mas sujeitos ativos, como diz Marx, críticos e reflexivos, fazedores e construtores de nossa e de outras histórias
          Outra passagem interessante é a fala de Paulo Cesar Lopes que diz: "cada experiência de olhar é um limite" NOSSA!!! Isto é fantástico!! Porque vemos, através da grade de leitura do vivido, pelo que aprendemos nos múltiplos processos de socialização, sendo este direcionado, ou fruto do imprevisivel!! Construindo um campo representacional que permeará não só o nosso olhar, mas o olhar do grupo ao qual pertencemos, ou com quem construimos um sentimento de pertença, uma identidade. Então, até entrarmos em contato com o diferente, consideramos as verdades do nosso grupo de pertencimento. Ninguém questiona o igual, é o diferente que nos chama a uma reflexão, é ele que nos coloca frente as certezas e nos mostram que existem outras certezas, fazendo-nos refutar as novas ou abraça-las, ou seja, temos um primeiro olhar etnocêntrico, preconceituoso com a vida, o mundo... Contudo, é o diferente que nos faz refletir e ampliar o olhar para outras possibilidades de leituras de mundo, em que mesmo que não as aceitemos, precisamos respeitá-las incondicionalmente, e, assim, com este olhar, entramos no universo do relativismo cultural.
             Manoel Barros, acho, diz que: "o olho vê, a memória revê e a imaginação transvê, transfigura, transforma o mundo". UAU!!! Temos aqui a chave do campo representacional, que conforme Durkheim, representações sociais são conceitos, imagens e sentimentos que Moscovici ampliou para o como esta construção ocorre, para como são formadas as representações, e, realmente, só podemos representar, ou apresentar o que conhecemos, e, neste bojo, a imaginação contribui para consolidar e ampliar este campo representacional. Geertz, em Cultura e Mente (In: A interpretação das culturas), menciona que o cerebro é a máquina, mas é a imaginação, o software que faz com esta máquina funcione. E, Leslie White, sempre disse que:" se queres conhecer o significado de um símbolo, deves conhecer o grupo que o criou" trabalhando a diversidade cultural, simbolíca no campo da linguagem.
                 Linguagem está que está sendo reduzida a imagens, e no documentário três pessoas maravilhosas abordam isto, Carmela Gross, Win Wenders e José Saramago. Carmela Gross diz:"Ninguém jamais se imagina pensando fora de foco", chamando-nos a uma reflexão sobre o que é o normal e o anormal em um grupo, são construções sócio-psiquicas- culturais. Win Wenders diz que: "Antes os filmes possuiam tomadas longas sem fala, para que o telespectador pudesse participar desta construção, entrasse ou refletisse sobre o que estava assistindo, dando vasão a sua imaginação; mas hoje, os filmes estão repletos de imagens, não precisamos mais questionar, pensar, as imagens já estão lá, dadas, postas, é só digeri-las..." e Saramago diz que:"Foi preciso que esperassemos todos estes anos para que finalmente vivessemos a caverna de platão, em que vemos as sombras, as imagens e acreditamos que são a realidade. Vivemos em um mundo imagético"..
                  Assim, as linguagens se pluralizaram, mas em compensação, as reflexões deram espaço para uma preguiça mental que assusta... Logo, sente-se a necessidade de suscitar estes espaços de questionamentos, de troca, de dialogo fazendo com que os olhares se pluralizem ou caminhem para o mesmo ponto neste universo interpretacional, simbólico.
                   E, munido deste espírito questionador Eugen Bavcar, diz que:" muitas vezes os colegas querem ver por nós, mas que é importante vermos por nós mesmos" E, neste contexto o conhecimento faz isto, leva-nos para outros olhares e visões, outras possibilidades de compreensão de mundo que jamais teriamos se não fossem nossas vivências.. Nossas vivências...
                   Também, tem-se lugar neste espaço reflexivo para a emoção, que vem do amor de Agnes Varda por Jacques que fez com que ela o filmasse através de uma aproximação da camêra que nenhuma outra pessoa poderia fazer, simplesmente, porque ela, que o amava, queria captar os detalhes mais sutis e que ficariam para sempre na sua memória através da proximidade com que observa o homem amado.. É como se ela o acariciasse com a camera e o cheirasse, o tocasse... É um momento lindo!!!
                     É um momento que nos chama a uma reflexão para o fato que vemos com todos os sentidos... E que o caminho para a alma do outro é dado em cada espaço de abertura que o outro e você dão-se, permitem-se nos seus múltiplos encontros...
                                                                            (Marcia Adriana L. de Oliveira)
                    
       

domingo, 10 de julho de 2011

Reflexões sobre Harry Potter.

      Harry Potter é uma história contada em vários livros, que foram transformados em filme, com os mais inusitados títulos e temas. E, que termina com Harry Potter e as Relíquias da Morte.
       A magia, misturada a amizade, amor, fidelidade, coragem, emoção, aventura foram os temperos maravilhosos ao longo de toda a série. Bem, como ver o crescimento dos atores que assumiram o desafio de realizar e materializar a série de Potter é encantador.
       Conforme Augé, Mead a magia só tem eficácia se você acredita nela. E, como não acreditar, por instantes neste mundo paralelo existente na Inglaterra? A relação de alteridade, que significa "a qualidade do outro", ou o encontro com o diferente e todas as emoções presentes neste encontro (JOVCHELOVITCH), está presente em várias cenas do filme, que nos coloca frente a caras, faces, rostos e pessoas as mais diferentes, em tamanho, forma, estatura, subjetividades. Personagens greco-romanos, ganham forma nas histórias de Harry Potter, o centauro, o cavalo alado, o unicórnio, dentre inúmeros outros... Sem falar do antropozoomorfismo, presente no Egito que ganha forma de vários seres presentes nos filmes..
         O gigante Hagrid mostra o quanto as aparências enganam, sendo um dos principais personagens de sua história, quase assumindo os cuidados por Harry e seus amigos. É maravilhoso!! E a constante luta entre o bem, Harry e seus amigos, e o mal, Voldemort e seus aliados, faz com que a cada filme, todos queiram saber como este vai terminar...
          Outra dimensão importante é que Harry cresce em idade, transformações corpóreas, mas também em maturidade, pois, apesar da idade, a cada filme, assume responsabilidades e tem que tomar decisões que envolvem vida e morte. Não há espaços para erros, ou dúvidas, apesar do medo, o enfrentamento deste, faz com que passe a ter outros olhares sobre a própria morte, esperando sempre o momento do confronto final.
           O respeito a diversidade, através do relativismo cultural é observado nas suas falas, embora, o universo bruxo, tenha uma visão dos não bruxos tão etnocêntrica quanto estes tem dos bruxos.
           O terror, também está presente em cenas fortes que envolvem a morte, perda, o terror, manifesto no rosto antropozoomorfico de Voldemort, hibrido, meio ofídio, meio humano e que sempre coloca Harry em apuros, mas sempre é derrotado.
            Dumbledore assume os cuidados com Harry, e somente, nas Relíquias da Morte, vê-se que ele não era o tutor de Harry, mas apenas alguém que o prepararia para o confronto final. Começam, então a procurar as horcruxes, e destrui-las, cabendo a Harry, finalizar está missão, que o faz no final do referido filme.
            E, em meio a toda esta busca pelos pais, pela família, ao longo de todos os livros. Embora, saiba que já estão mortos, mas quem eram, a saudade, enfim, o desejo de saber mais sobre si, e sua família, permeiam a série. E, neste processo de busca de si, Harry é abraçado pela família de Rony, e constrói com Gina, irmã de Rony a sua família, a sua história, e Hermione casa-se com Rony, fazendo prevalecer a amizade, o carinho, a união e a fidelidade.
            Aqui tem-se família como diz Oliveira, Durham, Abreu e outros estudiosos da família, tem-se família como "laços de descendência por consanquinidade e por afinidade", fazendo com que o amor, o carinho, a acolhida seja realizada, não por ser irmão consanguineo, mas por ser tão amigo que se tornou irmão.
            Eu, gostei do filme e de todos da série, embora, dentro do campo representacional, saiba-se que ninguém pode representar, apresentar o que não conhece....