Olhares sócio-antropológicos sobre Filmes, textos, artigos, livros, documentários,..

Amo cinema e vejo nos filmes inúmeras oportunidades de refletirmos sobre a vida, sobre temas diversos que nos tocam de maneiras diferentes, a partir de nossas grades de leitura e nossas vivências.
Assim, faremos neste primeiro momento reflexões sobre filmes, documentários que assisti e partilhei com meus colegas de sala (educandos) e outros que assisti em momentos de lazer criativo e produtivo. E, em um segundo momento farei comentários de livros, textos, artigos, enfim, o que li e como apreendi o lido, e os frutos de minha vivência, do meu dia-a-dia, do meu vivido também. Tudo isto será partilhado aqui com cada um de vocês!!

Boa Leitura!!

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Janela da Alma (Documentário Brasileiro de João Jardim e Walter Carvalho)

      Este foi e continua sendo um dos melhores documentários brasileiros que já assisti na proposta apresentada. O filme nos chama a uma reflexão sobre os olhos serem e terem sido considerados como "as janelas da alma". "Será que os olhos são, realmente, as janelas da alma?" "Será que a primeira impressão é a que fica?"
       Na Antropologia aprendi, com a vivência, que os olhos não são as janelas da alma, mas sim portas para equívocos, pois, no primeiro momento de um encontro com outro, observa-se, buscando traços ou características que nos coloquem em uma posição confortável com relação ao outro. Busca-se encontrar semelhanças, enfim, um encontro com um espelho, e, não com o outro como outro. E, neste processo interrelacional, os olhos julgam, pré-julgam, enquadram e são enquadrados nas dimensões culturais que permeiam nossas vidas. Fazendo que apenas a convivência, possibilite a ambos uma aproximação ou distanciamento, um real encontro consigo e com o outro como duas subjetividades, e, não projeções.
         Ao ver o documentário percebe-se na fala de Antônio Cicero que os olhos não são as janelas da alma, porque a janela não vê, "quem vê é o olho através da janela"... Oliver Sacks também diz que "os olhos como janelas, colocam-nos como passivos frente ao conhecimento ao mundo, em que tudo ou sai ou entra, e na realidade as coisas entram e saem a cada encontro, a cada conhecimento, a cada processo de crescimento, a cada partilha, assim, não somos passivos, mas sujeitos ativos, como diz Marx, críticos e reflexivos, fazedores e construtores de nossa e de outras histórias
          Outra passagem interessante é a fala de Paulo Cesar Lopes que diz: "cada experiência de olhar é um limite" NOSSA!!! Isto é fantástico!! Porque vemos, através da grade de leitura do vivido, pelo que aprendemos nos múltiplos processos de socialização, sendo este direcionado, ou fruto do imprevisivel!! Construindo um campo representacional que permeará não só o nosso olhar, mas o olhar do grupo ao qual pertencemos, ou com quem construimos um sentimento de pertença, uma identidade. Então, até entrarmos em contato com o diferente, consideramos as verdades do nosso grupo de pertencimento. Ninguém questiona o igual, é o diferente que nos chama a uma reflexão, é ele que nos coloca frente as certezas e nos mostram que existem outras certezas, fazendo-nos refutar as novas ou abraça-las, ou seja, temos um primeiro olhar etnocêntrico, preconceituoso com a vida, o mundo... Contudo, é o diferente que nos faz refletir e ampliar o olhar para outras possibilidades de leituras de mundo, em que mesmo que não as aceitemos, precisamos respeitá-las incondicionalmente, e, assim, com este olhar, entramos no universo do relativismo cultural.
             Manoel Barros, acho, diz que: "o olho vê, a memória revê e a imaginação transvê, transfigura, transforma o mundo". UAU!!! Temos aqui a chave do campo representacional, que conforme Durkheim, representações sociais são conceitos, imagens e sentimentos que Moscovici ampliou para o como esta construção ocorre, para como são formadas as representações, e, realmente, só podemos representar, ou apresentar o que conhecemos, e, neste bojo, a imaginação contribui para consolidar e ampliar este campo representacional. Geertz, em Cultura e Mente (In: A interpretação das culturas), menciona que o cerebro é a máquina, mas é a imaginação, o software que faz com esta máquina funcione. E, Leslie White, sempre disse que:" se queres conhecer o significado de um símbolo, deves conhecer o grupo que o criou" trabalhando a diversidade cultural, simbolíca no campo da linguagem.
                 Linguagem está que está sendo reduzida a imagens, e no documentário três pessoas maravilhosas abordam isto, Carmela Gross, Win Wenders e José Saramago. Carmela Gross diz:"Ninguém jamais se imagina pensando fora de foco", chamando-nos a uma reflexão sobre o que é o normal e o anormal em um grupo, são construções sócio-psiquicas- culturais. Win Wenders diz que: "Antes os filmes possuiam tomadas longas sem fala, para que o telespectador pudesse participar desta construção, entrasse ou refletisse sobre o que estava assistindo, dando vasão a sua imaginação; mas hoje, os filmes estão repletos de imagens, não precisamos mais questionar, pensar, as imagens já estão lá, dadas, postas, é só digeri-las..." e Saramago diz que:"Foi preciso que esperassemos todos estes anos para que finalmente vivessemos a caverna de platão, em que vemos as sombras, as imagens e acreditamos que são a realidade. Vivemos em um mundo imagético"..
                  Assim, as linguagens se pluralizaram, mas em compensação, as reflexões deram espaço para uma preguiça mental que assusta... Logo, sente-se a necessidade de suscitar estes espaços de questionamentos, de troca, de dialogo fazendo com que os olhares se pluralizem ou caminhem para o mesmo ponto neste universo interpretacional, simbólico.
                   E, munido deste espírito questionador Eugen Bavcar, diz que:" muitas vezes os colegas querem ver por nós, mas que é importante vermos por nós mesmos" E, neste contexto o conhecimento faz isto, leva-nos para outros olhares e visões, outras possibilidades de compreensão de mundo que jamais teriamos se não fossem nossas vivências.. Nossas vivências...
                   Também, tem-se lugar neste espaço reflexivo para a emoção, que vem do amor de Agnes Varda por Jacques que fez com que ela o filmasse através de uma aproximação da camêra que nenhuma outra pessoa poderia fazer, simplesmente, porque ela, que o amava, queria captar os detalhes mais sutis e que ficariam para sempre na sua memória através da proximidade com que observa o homem amado.. É como se ela o acariciasse com a camera e o cheirasse, o tocasse... É um momento lindo!!!
                     É um momento que nos chama a uma reflexão para o fato que vemos com todos os sentidos... E que o caminho para a alma do outro é dado em cada espaço de abertura que o outro e você dão-se, permitem-se nos seus múltiplos encontros...
                                                                            (Marcia Adriana L. de Oliveira)
                    
       

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